quinta-feira, 2 de agosto de 2012

VII

Não me lembro direito daqueles olhos azuis.
Lembro me que era terça à tarde, de um dia de junho, e que fazia sol.
Tudo que queria era um café e um cigarro.
Juntei minhas moedas e comprei, por 70 centavos, um Marlboro light picado.
Fui até a cafeteria e não entrei.
Não podia fumar lá.
Comprei um espresso pelo lado de fora.
Pelo caixa.
Ai encontrei a dona daqueles olhos.
Era seu primeiro dia de trabalho na cafeteria, colocaram-na para administrar o caixa.
E receber os fumantes.
O espresso era encorpado, bem frutoso e um pouco ácido.
Puxei papo.
"Seria legal morar por aqui" falei.
Os olhos me fitaram.
Ela respondeu.
Começamos a conversar.
Lembro me da conversa, mas acho desnecessária a transcrição da mesma.
Me lembro mais dos olhos azuis.
Não sou homem de me encantar com olhos azuis e verdes.
Aqueles eram diferentes.
A beleza deles vinham de uma profundidade misteriosa.
Pareciam dois vitrais vaticanescos me encarando.
Eu lembro de ter pensado que ela era boa demais pra trabalhar ai.
Ela merecia tudo que alguém pudesse dar.
Fiquei com medo.
Paralisei.
Naquela Fossa das Marianas abismal, aquele azul mortífero.
Acabou o cigarro.
Fui embora.
Até esqueci de pagar o café.
A dona dos olhos me gritou.
Pelo nome.
Paguei.
Depois nem a vi.
Volto sempre no café.
Nunca a vejo lá.

Sumiu.

Será que alguém tirou ela de lá?
Poderia ter sido eu.
Aquele dia passei mal.
Fui parar no hospital.
Meu corpo recusava tudo

menos

aqueles olhos.




Hoje, me lembro perfeitamente dos olhos. Mas nem me lembro da dona.

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